A luxação de patela é uma condição ortopédica frequentemente observada em cães de raças pequenas, e o Lhasa Apso é um exemplo notável devido à sua predisposição genética e características anatômicas específicas.
A patela, um pequeno osso no joelho, desliza fora de seu sulco normal no fêmur, resultando em dor e instabilidade na articulação. O problema é categorizado em quatro graus, de acordo com a gravidade, variando desde uma luxação ocasional que se corrige sozinha (grau I) até uma deslocação permanente e não redutível (grau IV). Em raças como o Lhasa Apso, o desenvolvimento dessa condição pode ser influenciado por uma combinação de fatores hereditários e conformação anatômica, incluindo ângulos articulares específicos e o alinhamento dos membros posteriores.
Nos Lhasa Apsos, a predisposição à luxação de patela se deve a aspectos conformacionais que favorecem a ocorrência do problema, como a angulação do joelho e a menor profundidade do sulco femoral, onde a patela normalmente se encaixa. A genética desempenha um papel crítico, sendo essa característica hereditária, o que torna o diagnóstico precoce uma ferramenta essencial para o manejo adequado da condição. Embora os sinais possam se manifestar já em filhotes, é comum que os sintomas se tornem mais evidentes com a maturidade, especialmente durante atividades físicas mais intensas.
Os sintomas clínicos variam de acordo com o grau da luxação. Inicialmente, o cão pode apresentar episódios intermitentes de claudicação, frequentemente descritos como “pular” alguns passos ao correr ou caminhar. À medida que a condição progride, a dor e a inflamação podem se tornar mais persistentes, e o animal pode relutar em se mover ou evitar colocar peso sobre o membro afetado. Em graus mais avançados (graus III e IV), além de claudicação severa, há também uma evidente deformidade na articulação e limitação significativa de movimento. Se a luxação não for tratada, o desalinhamento da patela pode resultar em desgaste excessivo da cartilagem articular, contribuindo para o desenvolvimento de osteoartrite e rupturas secundárias do ligamento cruzado cranial.
O diagnóstico de luxação de patela no Lhasa Apso geralmente é realizado durante um exame físico detalhado, onde o veterinário manipula a articulação do joelho para avaliar a mobilidade e estabilidade da patela. Os testes ortopédicos são complementados por exames de imagem, como radiografias, para fornecer uma visão mais clara das alterações articulares e avaliar a presença de condições concomitantes, como displasia coxofemoral. A tomografia computadorizada pode ser recomendada em casos mais complexos, permitindo uma avaliação tridimensional dos componentes ósseos.
O tratamento da luxação de patela depende principalmente do grau e da cronicidade da condição. Para luxações de grau I e alguns casos de grau II, onde os sintomas são leves e intermitentes, pode-se optar por um manejo conservador, que inclui fisioterapia para fortalecer os músculos ao redor do joelho, controle rigoroso do peso para minimizar o estresse articular e o uso de anti-inflamatórios não esteroidais para controlar a dor. Técnicas de reabilitação avançada, como hidroterapia e acupuntura, também podem ser incorporadas para acelerar a recuperação e reduzir o risco de agravamento.
Para os casos mais graves (graus II, III e IV), a correção cirúrgica é geralmente a melhor abordagem. As técnicas cirúrgicas variam e podem incluir a transposição da crista tibial para reposicionar a patela, a trocleoplastia para aprofundar o sulco femoral e melhorar o encaixe da patela, e a imbricação capsular os tecidos ao redor da articulação. Em alguns casos, pode ser necessário combinar várias técnicas para alcançar um resultado mais duradouro. A decisão cirúrgica deve ser cuidadosamente planejada, levando em consideração a idade do cão, o nível de atividade, o histórico de saúde e a presença de alterações degenerativas.
O pós-operatório é um momento crítico na recuperação e na prevenção de recidivas. Um protocolo de reabilitação deve ser implementado, com o uso de modalidades fisioterápicas, como alongamentos passivos, exercícios de fortalecimento e terapias complementares (laserterapia e eletroterapia), que promovem a regeneração dos tecidos e melhoram a funcionalidade do membro. Em cães pequenos como o Lhasa Apso, o controle do ambiente durante a recuperação é essencial para evitar atividades que possam comprometer o resultado cirúrgico, como saltos e movimentos bruscos.
Além disso, é importante destacar que a luxação de patela em Lhasa Apsos pode ter um componente bilateral, afetando ambos os joelhos. Portanto, mesmo após a correção de um lado, o outro deve ser monitorado de perto para sinais de luxação. O acompanhamento contínuo com o veterinário, incluindo avaliações ortopédicas periódicas e controle de peso, é fundamental para garantir a longevidade e a qualidade de vida do animal.
A luxação de patela não é apenas uma questão ortopédica, mas também de manejo e estilo de vida, especialmente para raças predispostas. Cuidar de um Lhasa Apso com essa condição requer uma abordagem multifacetada que inclua diagnóstico precoce, tratamentos personalizados e uma compreensão profunda das necessidades específicas da raça.
Referências bibliográficas
1. Vasseur, P. B., & Arnoczky, S. P. (1981). "Diagnosis and treatment of medial patellar luxation in the dog." *Veterinary Clinics of North America: Small Animal Practice*, 11(4), 839-848.
2. Singleton, W. B. (1969). "The surgical correction of patellar luxation in the dog." *Journal of Small Animal Practice*, 10(1), 59-69.
Sobre o autor
Felipe Garofallo é médico-veterinário (CRMV/SP 39.972), especializado em ortopedia e neurocirurgia de cães e gatos e proprietário da empresa Ortho for Pets: Ortopedia Veterinária e Especialidades. Agende uma consulta presencial pelo whatsapp (11)91258-5102
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